Vladimir Safatle
Falta ainda a audácia revolucionária
que arremessa ao adversário a frase provocadora:
Nada sou e serei tudo.
(Karl Mar
Karl Marx
Genealogia do proletariado
Qual o lugar atual do proletariado no horizonte de emergência de sujeitos políticos? Para compreender melhor este ponto, há de se insistir que uma situação define a emergência do proletariado, a saber, sua absoluta despossessão. De fato, conforme definido da Constituição Romana, proletário é a última das seis classes censitárias, classe composta por aqueles caracterizados por, embora sendo livres, não terem propriedade alguma ou por não terem propriedades suficientes para serem contado como cidadão com direito a voto e obrigações militares. Sua única possessão é a capacidade de procriar e ter filhos. Reduzidos assim à condição biopolítica a mais elementar, à condição de reprodutor da população, os proletários representam o que não se conta. Daí uma colocação importante de Jacques Rancière: “Em latim, proletarii significa “pessoa prolífica” – pessoa que faz crianças, que meramente vive e reproduz sem nome, sem ser contada como fazendo parte da ordem simbólica da cidade” 1. Até o final do século XVIII, proletário designa o que é “mal, vil” ou, em francês, como sinônimo de “nômade”, de sem lugar.
É no bojo da Revolução Francesa, e principalmente depois da Revolução de 1830, que o termo será paulatinamente acrescido de conotação política, agora para descrever os que só possuem seu salário diário pago de acordo com a necessidade básica de auto-conservação, sejam camponeses ou operários, e que devem ser objetos de ações políticas feitas em nome da justiça social. Neste sentido, os proletários não são ainda o nome de um sujeito político emergente, mas o nome de um ponto de sofrimento social intolerável, um “significante central do espetáculo passivo da pobreza”2. Exemplo claro neste sentido é o uso do termo feito por Saint-Simon. É entre os saint-simonistas que a dicotomia entre proletários e burgueses será descrita pela primeira vez, ainda que em um horizonte de reconciliação possível de interesses.
Neste sentido, mais do que cunhar o uso social do termo, o feito de Marx encontra-se em vincular o conceito de proletariado a uma teoria da revolução ou, antes, a uma teoria das lutas de classe que é a expressão da “história da guerra civil mais ou menos oculta na sociedade existente”3. Daí porque Marx falará, a respeito dos saint-simonistas e de outros socialistas “crítico-utópicos”: “Os fundadores desses sistemas compreendem bem o antagonismo de classes, assim como a ação dos elementos dissolventes na própria sociedade dominante. Mas não percebem no proletariado nenhuma iniciativa histórica, nenhum movimento político que lhes seja peculiar”4.
A sua maneira, Marx partilha com Hobbes a compreensão da vida social como uma guerra civil imanente. No entanto, como não se trata de pensar as condições para a formação da sociedade como associação de indivíduos, mas parar de pensar a vida social a partir da elevação do indivíduo como célula elementar, esta guerra não será a expressão da dinâmica concorrencial entre indivíduos desprovidos de relações naturais entre si. Ela será uma guerra de classes no interior da qual uma das classes aparece como o conjunto daqueles que nada mais dispõem. Por isto, uma guerra que só pode levar não a vitória de uma classe sobre outra, mas à destruição do princípio que constitui as classes, a saber, o trabalho e a propriedade como atributo fundamental dos indivíduos. O que explica porque Marx deverá ser claro:
A revolução comunista se dirige contra o tipo anterior de atividade, elimina o trabalho e suspende a dominação de todas as classes, ao acabar com as próprias classes já que essa revolução é levada a cabo pela classe a qual a sociedade não considera como tal, não reconhece como classe e que expressa, de per se, a dissolução de todas as classes, nacionalidades etc. dentro da sociedade atual5.
Teremos de entender melhor o que significa dizer que o proletariado expressa a dissolução de todas as classes, a dissolução do que constitui classes. Inicialmente, lembremos como tal guerra civil entre proletários e burguesia que leva à revolução é fruto de uma contradição cujo motor é a própria burguesia. Marx não cansará de afirmar que a burguesia é uma classe revolucionária: “A burguesia não pode existir sem revolucionar incessantemente os instrumentos de produção, por conseguinte, as relações de produção e, com isso, todas as relações sociais”6. É ela que mostrará como tudo o que é solido se desmancha no ar. No entanto, a burguesia é uma espécie de agente involuntário da história. Ela: “assemelha-se ao feiticeiro que já não pode controlar os poderes infernais que invocou”7, ela “produz seus próprios coveiros”8. Ou seja, sua ação é contraditória porque, no processo de auto-realização de si, a burguesia produz uma figura que lhe será oposta e que lhe destruirá. Assim, a burguesia é o local no qual se realiza uma impressionante operação de auto-negação que não é apenas a auto-negação dos interesses de uma classe, mas a auto-negação da própria “produção da vida” vigente até agora com suas relações entre sujeitos, entre sociedade e natureza, entre o sujeito e si mesmo.
Tal auto-negação é impulsionada pela produção do excesso. A burguesia produz crises descritas como “epidemias de superprodução” que destroem grande parte das forças produtivas já criadas: “A sociedade possui civilização em excesso, meios de subsistência em excesso, indústria em excesso, comércio em excesso”. Um excesso que: “lança na desordem a sociedade inteira e ameaça a existência da propriedade burguesa”. Pois tal excesso de produção, de comércio, de civilização leva a uma desvalorização tendencial da produção que só pode ser superada através ou da destruição violenta de grande quantidade de forças produtivas ou pela conquista de novos mercados, pela exploração mais intensa dos antigos. Ela leva uma estrutura monopolista que só pode significar a abolição da propriedade privada “para nove décimos da sociedade”. No entanto, tal desordem produzida pela burguesia e sua escalada global não é apenas o anúncio da destruição. Ela é a produção involuntária de novas relações que tem em seu germe a forma de outro mundo:
Apenas esse desenvolvimento universal das forças de produção traz consigo um intercâmbio universal dos homens em virtude do qual, por um lado, o fenômeno da massa “despossuída” se produz simultaneamente em todos os povos (concorrência universal), fazendo com que cada um deles dependa das transformações revolucionárias dos outros e, por último, institui indivíduos histórico-universais, empiricamente universais, em vez de indivíduos locais9.
A desordem produz um fenômeno universal de despossessão e de intercâmbio. Mas tal despossessão universal não é apenas um fenômeno negativo, pois ele produz novas formas de interdependência e de simultaneidade. A burguesia abre o espaço para o advento de indivíduos histórico-universais caracterizados pela despossessão comum e pela simultaneidade de tempos até então completamente dispersos. Ela produz as condições para o advento de uma universalidade concreta que suspenderá e superará o estado de coisas atual. É assim que ela produz seus próprios coveiros.
A indeterminação social do proletariado
Isto demonstra como, segundo Marx, a revolução só pode ser feita pela classe dos despossuídos de predicado e profundamente despossuídos de identidade. Classe formada por “indivíduos histórico-universais, empiricamente universais, em vez de indivíduos locais”10, o que se coaduna muito pouco com a visão de operários que lutam pelo reconhecimento de suas tradições e formas de vida. Para que apareçam indivíduos histórico-universais, faz-se necessário uma certa experiência de negatividade que, desde Hegel, é condição para a fundamentação da verdadeira universalidade. Tal experiência, o proletariado a sofre através da despossessão completa de si descrita por Marx em termos como:
O proletário é desprovido de propriedade (eigentumslos); sua relação com mulher e crianças não tem mais nada a ver com as relações da família burguesa; o trabalho industrial moderno, a moderna subsunção ao capital, tanto na Inglaterra quanto na França, na América quanto na Alemanha, retiraram dele todo caráter nacional. A lei, a moral, a religião são para ele preconceitos burgueses que encobrem vários interesses burgueses11.
Como vemos, o proletariado não é definido apenas a partir da pauperização extrema, mas da anulação completa de vínculos a formas tradicionais de vida. Tais vínculos não são recuperados em um processo político de reafirmação de si, não se trata de permitir que os proletários tenham uma nação, uma família burguesa, uma moral e uma religião. Tais normatividades são negadas em uma negação sem retorno. No entanto, tal negação não leva o proletariado a aparecer como “essa massa indefinida, desestruturada e jogada de um lado para outro, que os franceses denominam la bohème”12 e que Marx define como “lumpemproletariado”13. Vale a pena discutir melhor este ponto porque não foram poucos aqueles que tentaram, desde Bakunin, transformar o conceito de lumpemproletariado no verdadeiro conceito com força revolucionária em Marx14.
Tal como acontece com o conceito de proletariado, o conceito de lumpemproletariado não descreve imediatamente um agente econômico, mas um tipo de sujeito político, ou antes, uma espécie de anti-sujeito político. Lembremos da estranha extensão que o termo toma no 18 do brumário:
Roués decadentes com meios de subsistência duvidosos e de origem duvidosa, rebentos arruinados e aventurescos da burguesia eram ladeados por vagabundos, soldados exonerados, ex-presidiários, escravos fugidos das galeras, gatunos, trapaceiros, lazzaroni, batedores de carteira, prestidigitadores, jogadores, maquereux, donos de bordel, carregadores, literatos, tocadores de realejo, trapaceiros, amoladores de tesouras, funileiros, mendigos, em suma, toda essa massa indefinida, desestruturada e jogada de um lado para outro, que os franceses denominam la bohème15.
Difícil não ler esta série descrita por Marx com seus literatos e amoladores de tesoura sem se lembrar da Enciclopédia fantástica de Borges. Pois o que totaliza esta série não é a suposta analogia entre seus elementos a partir do desenraizamento social. A este respeito, lembremos como em Luta de classe na França, Marx chega a descrever a própria aristocracia financeira como “o renascimento do lumpemproletariado nos cumes da sociedade burguesa”. Há um lumpemproletariado no baixo nível do estrato social e no alto nível, sendo os do alto nível perfeitamente enraizados à escroqueria funcional do capitalismo financeiro.
O que os une é, na verdade, uma certa concepção de improdutividade, uma diferenciação entre trabalho produtivo e trabalho improdutivo, mas diferenciação concebida do ponto de vista da produtividade dialética da história. Pois o lumpemproletariado é uma massa desestruturada cuja negatividade não se coloca como contradição em relação às condições do estado atual da vida. Neste sentido, ele é a representação social da categoria de negatividade improdutiva. Por isto, trata-se de uma massa heterogênea que pode ganhar homogeneidade desde que encontre um termo unificador que lhe dará estabilidade no interior da situação política existente. Tal termo, no 18 do brumário, não é outro que Napoleão III, “o chefe do lumpemproletariado”. Aquele que dá homogeneidade a tal heterogeneidade social, a história mesma repetida como farsa e que deve se confessar enquanto farsa para poder se manter.
No entanto, há de se insistir como o modelo de estabilização produzido por Napoleão III é uma espécie de estabilização na anomia. Através de Napoleão III, a heterogeneidade do lumpemproletariado permanece radicalmente passiva, permanece como ação anti-política, pois acomoda-se à gestão do desenraizamento social, seus crimes romantizados não se transformam em ação de transformação alguma. Na verdade, essa desestruturação e indefinição anômica do lumpemproletariado é própria de quem ainda conserva a esperança de retorno da ordem, ou que não é capaz de conceber nada fora de uma ordem que ele mesmo sabe estar completamente comprometida. O que faz suas ações políticas serem apenas “paródias” de transformações, “comédias”, ou ainda, “mascaradas”: todos termos usados por Marx no 18 de brumário para falar de revoluções que são, na verdade, tentativas de estabilização no caos. O lumpemproletariado representa uma negatividade que não pode ser integrada no processo dialético porque ele representa o congelamento da negatividade em uma espécie de cinismo social.
Já o caso do proletariado é marcado pela ausência de qualquer expectativa de retorno. O proletariado é uma heterogeneidade social que simplesmente não pode ser integrada sem que sua condição passiva se transforme em atividade revolucionária. Por isto, ao ser desprovido de propriedade, de nacionalidade, de laços com modos de vida tradicionais e de confiança em normatividades sociais estabelecidas, ele pode transformar seu desamparo em força política de transformação radical das formas de vida. Para tanto devemos compreender que a afirmação da condição proletária não se confunde com alguma forma de demanda de reconhecimento de formas de vida desrespeitadas, claramente organizadas em suas particularidades. Ao contrário, a afirmação de tal condição proletária gera a classe destes sujeitos sem predicados que, como é dito na Ideologia alemã, poderão se satisfazer ao pescar de dia, pastorear à tarde e fazer crítica à noite, sem (e este é o ponto principal) ser pescador, pastor ou crítico, ou seja, sem permitir que o sujeito se determine inteiramente em seus predicados16. Isto significa que a atividade de pescar, pastorear e criticar não pode ser, ao mesmo tempo, identificação do sujeito.
Como em Hegel, a posição do sujeito, sua exteriorização, mostra como há algo de radicalmente anti-predicativo a animar o movimento da essência17. O que não poderia ser diferente se pensarmos o proletariado como essa classe “que expressa, de per si, a dissolução de todas as classes dentro da sociedade atual”18. A classe do que dissolve todas as classes por representar “a perda total da humanidade”19, o que não encontra mais figura na imagem atual do homem. Neste sentido, podemos dizer que, tal como na teoria hegeliana do sujeito (embora Marx desqualificasse tal assimilação por ver, em Hegel, uma elaboração meramente abstrata do problema), o proletariado só supera sua alienação ao se confrontar com o caráter profundamente indeterminado do fundamento e conservar algo desta indeterminação20. Seu papel de redenção (Erlösung) só pode ser desempenhado à condição de assumir sua natureza de dissolução (Auflösung). Como dirá Balibar, o advento do proletário como sujeito político é o aparecimento de um “sujeito como vazio”21 que não é, em absoluto, privado de determinações práticas. Essa manifestação de um vazio em relação às determinações identitárias atuais leva-nos a compreender que o reconhecimento de si só é possível à condição de uma crítica profunda de toda tentativa de reinstaurar identidades imediatas entre sujeito e seus predicados.
Se este for o caso, então poderemos dizer que a luta de classes em Marx não é simplesmente um conflito moral motivado pela defesa das condições materiais para a estima simétrica entre sujeitos dispostos a se fazerem reconhecer a partir da perspectiva da integralidade de suas personalidades. A abolição da propriedade privada deve acompanhar necessariamente a abolição de uma economia psíquica baseada na afirmação da personalidade como categoria identitária. Insistamos neste ponto lembrando de um importante trecho do Manifesto Comunista:
Os proletários não podem apoderar-se das forças produtivas sociais senão abolindo o modo de apropriação a elas correspondente e, por conseguinte, o modo de apropriação existente até hoje. Os proletários nada tem de seu a salvaguardar; sua missão é destruir todas as garantias e seguranças da propriedade privada até aqui existentes22.
Percebamos o caráter paradoxal deste trecho. Os proletários só podem apoderar-se das forças produtivas abolindo todo modo de apropriação até hoje existente. O modo de apropriação dos proletários é um modo que não existe até o momento, impensável até agora pois não é simples passagem da propriedade privada à propriedade coletiva. Ele é apropriação de quem não tem nada de seu a salvaguardar, de quem não tem nem terá nada que lhe seja próprio. Tal apropriação não é apenas a destruição da propriedade, mas também a destruição do próprio. Por esta razão, a luta de classes em Marx não pode ser compreendida como mera expressão de formas de luta contra a injustiça econômica, já que ela é também modelo de crítica à tentativa de transformar a individualidade em horizonte final para todo e qualquer processo de reconhecimento social. O que não poderia ser diferente se lembrarmos que, ao menos no interior da tradição dialética, “pessoa” é uma categoria derivada historicamente do direito romano de propriedade (dominus), uma categoria que, por ainda guardar os traços de sua origem, era vista já por filósofos como Hegel como “expressão de desprezo”23 devido à sua natureza meramente abstrata e formal advinda da absolutização das relações de propriedade24. Encontramos claramente em Marx esta crítica já presente em Hegel. Assim, Marx insistirá, por exemplo, que a noção de liberdade pressuposta pela Declaração dos direitos do homem e do cidadão, de 1793, era calcada em larga medida na absolutização do indivíduo proprietário. Daí uma colocação como:
“o limite dentro do qual um [cidadão] pode mover-se de modo a não prejudicar o outro é determinado pela lei do mesmo modo que o limite entre dois terrenos é determinado pelo poste da cerca. Trata-se da liberdade do homem como mônada isolada recolhida dentro de si mesma (…) A aplicação prática do direito humano à liberdade equivale ao direito humano à propriedade privada”25.
A liberdade, para Marx, passa pela liberação do sujeito de sua condição de indivíduo que se relaciona a outro indivíduo tal como dois terrenos separados pelo poste da cerca. Estaremos sendo fiéis ao espírito do texto de Marx se afirmarmos que, através da luta de classes, uma experiência social pós-identitária pode encontrar lugar. Podemos mesmo dizer que “proletariado” é a nomeação política da força social de desdiferenciação identitária cujo reconhecimento pode desarticular por completo sociedades organizadas a partir da hipóstase das relações gerais de propriedade26. Por esta razão, o proletariado não pode ser imediatamente confundido com a categoria de povo. Falta-lhe a tendência imanente à configuração identitária e limitadora que define um povo. O proletariado funciona muito mais como uma espécie de anti-povo, isto no sentido da potência sempre vigilante do que permanece a lembrar a provisoriedade das identidades, estados e nações, assim como da pulsação constante de integração do que se afirma inicialmente como exceção não-contada. Esta é uma maneira de aceitar proposições como:
A coisa toda seria muito simples se houvesse apenas a infelicidade da luta que opõe ricos e pobres. A solução do problema foi encontrada muito cedo. Basta suprimir a causa da dissensão, ou seja, a desigualdade de riquezas, dando a cada um uma parte igual de terra. O mal é mais profundo. Da mesma forma que o povo não é realmente o povo, mas os pobres, os pobres por sua vez não são realmente os pobres. Eles são apenas o reino da ausência de qualidade, a efetividade da disjunção primeira que porta o nome vazio de ‘liberdade’, a propriedade imprópria, o título do litígio. Ele são eles mesmo a união distorcida do próprio que não é realmente próprio e do comum que não é realmente comum27.
Neste sentido, a felicidade do conceito forjado por Marx residia em sua capacidade de sobrepor lógica política e descrição sociológica, permitindo a criação de uma relação profunda entre trabalhadores realmente existentes (que constituíam uma importante maioria social) e proletários28. No entanto, sustentar tal relação não é condição necessária para que o conceito marxista de “proletariado” continue a mostrar sua operatividade. Na situação histórica atual de reconfiguração da sociedade do trabalho, podemos repensar tal relação a fim de encontrar espaços outros para a manifestação de exigências próprias a uma certa ontologia do sujeito pressuposta pela construção marxista.
Notas:
1 RANCIÈRE, Jacques; “Politics, identification and subjectivation” in: RAJCHMAN, John; The identity in question, Nova York: Routledge, 1995, p. 67
2 STALLYBRASS, Peter; “Marx and heterogeneity: thinking the lumpemproletariat” In: Representations, vol 0, n. 31, p. 84
3 MARX, Karl e ENGELS, Friedrich; Manifesto Comunista, São Paulo: Boitempo, p. 50
4 Idem, p. 66
5 MARX, Karl e ENGELS, Friedrich; A ideologia alemã, op. cit., p. 98
6 Idem, Manifesto Comunista, p. 43
7 Idem, p. 45
8 Idem, p. 51
9 Idem, A ideologia alemã, p. 58
10 MARX, Karl; A ideologia alemã, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, p. 58
11 MARK, Karl; Manifest der Kommunistischen Partei in http://www.marxists.org/deutsch/archiv/marx-engels/1848/manifest/1-bourprol.htm
12 MARX, Karl; O 18 brumário de Luis Bonaparte, São Paulo: Boitempo, 2011, p. 91
13 Ver, por exemplo, THOBURN, Nicholas; “Difference in Marx: the lumpenproletariat and the proletarian unamable”; Economy and Society Volume 31 Number 3 August 2002: 434–460
14 Como vemos, por exemplo, em STALLYBRASS, Peter; “Marx and heterogeneity: thinking the lumpemproletariat” In: Representations, vol 0, n. 31, p. 84 e LACLAU, Ernesto; La razón populista, op. cit.
15 MARX, Karl; O 18 do brumário, op. cit., p. 91
16 MARX, Karl; A ideologia alemã, op. cit., p. 56
17 Como dirá Alain Badiou: “Marx já sublinhava que a singularidade universal do proletariado é não portar nenhum predicado, nada ter, e especialmente não ter, em sentido forte, nenhuma ‘pátria’. Essa concepção antipredicativa, negativa e universal do homem novo atravessa o século” (BADIOU, Alain; O século, Aparecida: Ideias e letras, 2007, p. 108).
18 MARX, Karl; A ideologia alemã, op.cit., p. 98
19 MARX, Karl; Crítica da filosofia do direito de Hegel – introdução, São Paulo: Boitempo, 2005, p. 156
20 Sobre este ponto da filosofia hegeliana, tomo a liberdade de remeter ao meu SAFATLE, Vladimir; Grande hotel abismo: para uma reconstrução da teoria do reconhecimento, São Paulo: Martins Fontes, 2012.
21 BALIBAR, Etienne; Citoyen sujet et autres essais d’anthropologie philosophique, Paris: PUF, 2011, p. 260. Trata-se de uma ideia presente também em Jacques Rancière, para quem: “os proletários não são nem os trabalhadores manuais nem as classes trabalhadoras. Eles são a classe dos não-contados, que só existe na própria declaração através da qual eles se contam a si mesmos como os que não são contados” (RANCIÈRE, Jacques; La mésentente: politique et philosophie, Paris: Galilée, 1995, p. 63).
22 MARX, Karl e ENGELS, Friedrich: Manifesto Comunista, op. cit., p. 50
23 HEGEL, GWF; Fenomenologia do Espírito – vol. II, Rio de Janeiro: Petrópolis, 1992, p. 33
24 Tal articulação entre “pessoa” e “propriedade” servirá de fundamento para uma larga tradição de reflexão que chegará até as discussões recentes sobre a “self-ownership” como atributo fundamental da pessoa (a este respeito, ver, entre outros COHEN, G.A.; Self-ownership, freedom and equality, Cambridge University Press, 1995). Embora este seja um debate de várias matizes, é certo que a tradição dialética de Hegel e Marx tende a lê-lo da maneira esboçada acima.
25 MARX, Karl; Sobre a questão judaica, São Paulo: Boitempo, 2010, p. 49.
26 Que esta força de desdiferenciação própria ao conceito de proletariado tenha ganhado evidência graças a marxistas franceses, como Badiou, Balibar e Rancière, isto demonstra como algo do descentramento próprio ao conceito lacaniano de sujeito alcançou a política através de ex-alunos de Louis Althusser. No entanto, tal descentramento tem sua matriz na noção de “negatividade” própria ao sujeito hegeliano. Assim, por ironia suprema da história, algo do conceito hegeliano de sujeito acaba por voltar à cena através da influência surda em operação nos textos de ex-alunos deste anti-hegeliano por excelência, a saber, Louis Althusser.
27 RANCIÈRE, Jacques; Le mésentente: politque et philosophie, Paris: Galiée, 1995, p. 34
28 Como nos lembra LACLAU, Ernesto; La razón populista, op. cit., p. 308

Imagen: Wassilly Kandinsky – Composición IV, 1911.